4.28.2007

A hora manca

Era uma hora manca, aquela. A impressão que tinha era mais ou menos a que tem uma presa na boca do leão: como se o Tempo tivesse deixado de ser interminável para tornar-se curto demais. Odiava sofrimentos, mas já não sabia se preferia uma morte rápida à uma vida longa e monótona. Se bem que, talvez, e puramente talvez, fosse muito melhor não pensar sobre isso. Se a lança tivesse que ferir-lhe o peito, que fosse, contanto que sua abstenção lhe poupasse da dor do fim, da dor do decorrer... Talvez, puramente.Segurava firme o volante, e as faixas iluminadas da estrada eram contínuas ou segmentadas, conforme lhe permitia o foco dos olhos que cedo ou tarde se fechariam de sono. Era tarde, Tempo demais na estrada, horas demais de sono interrompidas, excessivos rixares de ponteiros que o vento externo não abafava. Precisava dirigir. Precisava... Antes que o sono ou o carro lhe abalassem a vontade. Pensava... E o farol do caminhão lhe cegou o cérebro. Segurava firme o volante quando bateu na árvore, e mesmo depois, quando o peito esmagado pulsava em descontexto. Era uma hora manca, aquela, na qual talvez não soubesse se queria viver ou morrer. Talvez, puramente...